João,
Com todo
respeito...nunca fui filiado a um partido, tampouco nos tempos clandestinos...O
máximo que consegui foi ser próximo a "Ação Popular", na verdade
amigo de Honestino Guimarães (desaparecido), ele foi uma espécie de irmão mais
velho quando cheguei em Brasilia aos 15 anos de idade (1968). Mas posso te
contar que os meus heróis desde os 13 anos, todos eles eram comunistas, ao
menos um deles Geraldo Campelo integrava a direção do PCB-AM, visitava-o em sua
casa, ele gostava de mostrar as suas fotos na URSS, na China junto ao MAO, em
Cuba com Fidel e Che, etceteras.
Visita-lo era
sempre um ato de desobediência civil e familiar. Geraldo, apesar de ser da
elite-AM, por exemplo, o sobrinho viria ser senador da republica Jeferson
Peres, ele era renegado como tivesse contraído uma doença contagiosa Geraldo
vivia com a Maria (líder comunista) mas não eram casados. Os outros heróis eram
o líder estudantil amazonense, o comunista Amazonino Mendes e a sua namorada
Tarcila Negreiros entre outros. Já anos 70, ao menos Amazonino, já mostrava-se
disposto a apoiar quem combatia, inclusive os militares. Foi uma desilusão. Um
dia conversando com ele...justificou-se, "caboclo, já dei a minha
contribuição a causa". Dito isso, o que assistimos hoje é
deprimente..algo semelhante ao que me pareceu frustrante no Amazonino...
ex-comunistas agindo sob oportunismos, colaborando com argumentos que só
sedimenta o ódio ao PT e incluso todos aqueles que de alguma forma não são
petistas, mas defendem uma ordem social-democrática.
O mundo girou...O
papa Joao Paulo II, Ronald Reagan e Margaret Thatcher quando chegam ao poder
iniciam o desmanche das conquistas do pós-guerra e dos conflitos anos 60
(liberdades individuais), era o Acordo de Washington, aqui denominado de
"neo-liberalismo". Alavancou-se a epidemia do
consumo...desmoralizou-se o espirito coletivo e o individualismo (narcisismo),
o tal do animal-empresário exaltado como orgânico a humanidade. Caiu o Muro de
Berlim e com ela toda a mentira que se ergueu para justifica-la. A esquerda
viu-se perdida, assim como os jovens "beats" da geração perdida dos
EUA. E, aí que gostaria de afirmar. Acredito nas análises históricas que
recorrem a psicanálise: Herbert Marcuse, Norman O. Brown, Michel Foucaut, W.
Reich,Cristopher Lasch...Um dos maiores equivocos dos comunistas foi renegar
Sigmund Freud & não terem lido "O mal-estar na
civilização"(1930).
A perseguição
aos dissidentes ou aqueles que pensavam diferente (Maiakovski,
Eisenstein, Meyerhold, etc), quando não eram mortos, foram denominados
de loucos e levados ao hospício ou prisão (Gulag). E, antes que
encerre esta aborrecida argumentação (pelo texto extenso), quero
lembra-lo do psicanalista franco-martinica Frantz Fanon: “Todo pueblo
colonizado - es decir, todo pueblo en cuyo seno haya nacido un complejo de
inferioridad a consecuencia del enterramiento de la originalidad cultural
local- se sitúa siempre, se encara, en relación con la lengua de la nación
civilizadora, es decir, de la cultura metropolitana.”
abs
06Mai2015
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Caro Michiles,
Por brincadeira,
estamos muito... respeitosos.
Nós nos conhecemos
pouco, mas eu pelo menos admiro você como cineasta (conheço pouco também)
e pela sua ligação com a história, os pensamentos.
Não vamos exagerar
falando de perseguições. Os primeiros anos da URSS foram de grande liberdade.
Logo tudo caiu na politização extrema e nas disputas pelo poder. Tal como
aconteceu com o (meu) PCB, o setor popular inoculou todos os seus preconceitos
contra os intelectuais, incrivelmente manipulados pelos dirigentes
(intelectuais?) mais repressores. A esquerda do mundo engoliu aquilo em todo o
mundo, "em nome do socialismo". E muiiiiiitos não conseguiram
acreditar nas terríveis denúncias do stalinismo. Essa coisa de aplicar a
psicanálise à história é bastante duvidosa. Encanta, Fanon é um poeta da
revolução encantada. Alimenta a alma guerreira. É do nosso lado, do lado
da utopia comunista. Mas é preciso buscar raízes históricas mais
complexas para os comportamentos. Você sabe, eu fiquei contra a ideia de luta
armada, contra as idéias da tricontinental.Contra a ilusão poética da luta
armada, líderes quase como deuses conduzindo o povo para a luta. Sempre fui
PCB. Mas segui amigo de Cuba. .Os povos cultivam uma certa sabedoria diante do
poder. E cultivam o senso prático de suas vidas diante de ofertas sonhadoras.
Sentindo o poder como uma força acima de suas próprias forças, busca caminhos
que julga possíveis. Minha mãe ficava brava com meu pai quando ele discutia
política com amigos: era expor-se demais. Mas minha mãe não tinha esse complexo
do oprimido que se sente inferior diante da cultura do opressor. Claro que esse
sentimento também existe. Quando fui á região da Guerra do Contestado, descobri
lá que as famílias tinham vergonha de dizer que antepassados haviam lutado ( e
vencido em muitas batalhas) o exército brasileiro. Era claro: a classe
dominante inoculou na sociedade uma visão lombrosiana dos revoltosos. Aí está.
Isso é o que se deu depois da guerra. Um comportamento que misturava uma certa
vergonha e o medo da repressão. Mas esse sentimento não impediu que, durante a
guerra, os camponeses tenham aderido à luta e que suas relações com os coronéis
("compadres") se transformassem em relações de conflito e ódio.
Na verdade não
excluo sua visão como possível. Leio com prazer.
Mas, mesmo gostando
de teóricos como o Fanon, penso que o comportamento humano é mais complexo,
exige mais.
Estou muito
cansado, depois de um dia exigente demais.
E talvez esteja
sendo confuso.
Mas vou terminar
com três pensamentos:
1- A questão é a
democracia. A esquerda deve sempre se pautar por ela, aprimorá-la e não usá-la;
2- A esquerda deve
lutar sempre pelo poder dentro da democracia. Mas deve também admitir e estar
preparada para as derrotas.
3- As divisões da
esquerda nos anos 60, contra a ditadura, reafirmaram o que era mesmo preciso:
não há uma só esquerda nem no Brasil e nem no mundo. Os stalinistas queriam
isso mas o PCB, em sua Resolução de 58 afirmou o caráter nacional da luta
socialista no Brasil. Estávamos juntos mas não misturados...
Um abração,
JBA